Não quero deixar entrelinhas em
nada do que escrevo. Se as palavras nos juntaram, não posso deixar que nada te
deixe dúvidas: quando as lês. Fico a madrugar sobre verbos e parágrafos e vejo
as folhas de papel, lentas, espreguiçarem-se de tédio: perante a minha
lassidão: numa melancolia abstracta.
Ainda me lembro, de quando as
letras nos dançavam em latitudes diferentes, faziam-nos correr, faziam-nos
sonhar, ansiar em conhecer mais e mais – mais de todas as curvas e pontos dessa
avassaladora paixão – a escrita. Depois, a noite caindo de surpresa como um
fardo insone sob as nossas despedidas, “poemava-nos” os sonhos nas margens
sedentas, mas opostas, do mesmo rio.
Às vezes paro e penso: que um dia
as palavras podem recusar-se a reconhecerem- nos por entre o amontoado de
papel, amarelecido pelo tempo. Às vezes paro e penso na estação de serviço sem
poesia e vejo ainda o teu rosto, onde desfilavam sempre e só um amontoado de
palavras que te saíam em silêncio, pelos olhos, sem aviso.
Às vezes, paro e penso, que há no
meu olhar uma avidez eterna que segue o traçado á tua escrita, e que nunca nos
deixará partir para parte incerta.
Às vezes penso: vou ter cuidado
com os espaços, com as entrelinhas – não quero derrocadas de letras sobre as
folhas de papel, confusas, sem saberem se sou eu que as vou vestir com prosas
de amor e poemas de ficar, ou se és tu que as vais despir, com leituras
demoradas, apagando espaços e sombreando com os teus dedos fogo – as entrelinhas.
Às vezes paro: com medo de
escrever espaços em branco.
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