Por vezes vives na raiz das
minhas lágrimas. Vives no sítio onde me nascem rios salgados que de tão
aprisionados pelas margens sabem-se sem esperança de alcançar os sete mares.
Sobes-me ou desces-me as colinas e danças-me inevitavelmente na retina.
Inevitável e lento, trémulo e periclitante na lágrima retida; trémula, ali, a
lágrima por cair, ali de onde o mundo se reflete pardo e desfocado. Vês como
eu, o mundo desfocado e pardo, num porvir absurdo que nos falece antes que
seja. Por vezes fazes pequenas ondas no lago dos meus olhos e tremulas ao vento
a bandeira da revolta: queres que eu seja tempestade, que tudo apague, que tudo
lave, que tudo; mas a lágrima, mareada e sombria, grita e força a grade para
rolar livremente pela face. Evito a queda, porque não quero que roles com ela
até ao chão e te sujes no sangue que escorre dos meus pés. As caminhadas foram
sempre longas e os caminhos pródigos em gumes. Soubesse eu que as
lágrimas corriam só em direção à boca, soubesse eu que as lágrimas em que me
habitas corriam sempre em direção à boca; soubesse eu e soltava-as nessa
liberdade de sal aquoso; deixava-te entrar de novo em mim. E de novo, de novo,
sempre de novo, deixava que voltasses a ser líquido, quente e terno, recolhido, na
raiz das minhas lágrimas.
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